Jamile Sabatini Marques*
Notícias sobre falta de mão de obra especializada no setor tecnológico são constantes nos jornais brasileiros. Já enfrentávamos esse problema antes da pandemia de Covid-19 e, com a aceleração da transformação digital ocorrida nesse período, essa escassez está ainda mais em evidência. Sendo a tecnologia transversal na economia, esses profissionais atendem muitas áreas do mercado, como os setores financeiros e de consultorias especializadas. Além disso, o momento atual evidenciou oportunidades de trabalhar para empresas de qualquer lugar do mundo, sem que haja necessidade de mudança, conciliando assim trabalho, qualidade de vida e bem-estar. Diante destes pontos, é urgente que haja um programa do governo, das empresas e do terceiro setor para que, juntos, possam combater a diferença entre a oferta de emprego que o mercado oferece e a procura por trabalho.
Hoje, o país não consegue formar um número adequado de profissionais para garantir a competitividade das empresas do setor tecnológico. E a tendência é que esse quadro fique ainda mais acentuado: Segundo dados do CESAR (2021) sobre o apagão da mão de obra em TI, imagina-se que em 2024 teremos 420 mil vagas em aberto no país. Ao mesmo tempo, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o Brasil possui 14,3 milhões de pessoas na busca de um emprego.
Muitas empresas do setor de tecnologia buscam a diversidade nas suas contratações. E este ponto deve ser considerado até mesmo por um fator econômico: atualmente, as mulheres representam mais do que 50% da força de trabalho do país, o que não reflete o percentual de trabalhadoras no setor. Também se faz necessária a diversidade em todos os aspectos, não apenas no que tange ao gênero, como a capacitação de um número relevante de pessoas que representam minorias sociais que, hoje em dia, não têm fácil acesso aos recursos necessários para trabalhar na área.
Para que tenhamos um Brasil mais pujante, de mais empregos e oportunidades, com empresas mais competitivas, precisamos incentivar a mudança cultural. E essa mudança começa nos primeiros anos de vida dos cidadãos, nas escolas. Mesmo com a transformação digital cada vez mais acelerada, as instituições de ensino básico continuam apresentando como oportunidade de graduação as profissões tradicionais. Precisamos ensinar, por exemplo, que a formação em matemática não proporcionará ao aluno apenas a oportunidade de ser professor. Se analisarmos minimamente as possíveis áreas de atuação, a matemática leva pessoas a serem cientistas de dados, cientistas da computação, engenheiros de produção da tecnologia da informação, entre tantos outros. Além disso, é muito importante que as crianças e adolescentes aprendam na escola como serem bons líderes e trabalhar em equipe. O mundo que cada um trabalha em seu quadrado não existe mais.
As crianças e jovens deste país precisam conhecer o mercado de tecnologia, as oportunidades que podem ter na área e o que é necessário para contribuir para diminuir a desigualdade socioeconômica do país. Ainda falta incentivo, mas também existem vários cursos gratuitos oferecidos pelas empresas do setor, pelo governo e pela sociedade civil organizada a fim de contribuir com o desenvolvimento social e econômico do Brasil por meio do fomento à mão de obra. Já estamos vivendo no futuro, é tempo de capacitar cada vez mais pessoas para o setor tecnológico e assim termos um Brasil cada vez mais digital e menos desigual.
* Jamile Sabatini Marques é Diretora de Inovação e Fomento da ABES (Associação Brasileira das Empresas de Software) e pesquisadora do Instituto de Estudos Avançados (IEA), no Centro de Síntese da USP no Programa Cidades Globais