Pesquisa TIC Empresas mostra que uso de IA no Brasil está estagnado, enquanto Europa acelera adoção, especialmente entre médias e grandes empresas
por ABES | 10:00 am – 27 de junho de 2025

No dia 13/05 foi lançada a nova versão da pesquisa TIC Empresas, uma das mais tradicionais fontes de informações sobre a economia digital no Brasil. A pesquisa chega à sua décima sexta edição com indicadores diversos sobre a conectividade das empresas e sua maturidade digital1. Uma vez que a pesquisa possui como referência a pesquisa sobre uso de TIC nas empresas europeias, liderada pelo Gabinete de Estatística da União Europeia (EUROSTAT), é possível comparar os resultados do Brasil com diversos países europeus.
Tendo em vista os avanços e os investimentos apresentados por Estados Unidos e China, na Europa observa-se uma preocupação com a situação do continente em relação ao desenvolvimento de tecnologias digitais. Nesse sentido, em setembro de 2024, foi lançado o relatório Draghi2, resultado de diversos debates realizados por grandes empresas do setor de tecnologia, governos e universidades. O relatório traz diversas recomendações e alertas acerca do futuro da economia europeia, tendo em vista o distanciamento em relação aos Estados Unidos e à China, bem como estabelece como missão do bloco o desenvolvimento tecnológico sustentável. Um dos pontos mais relevantes do relatório é a discussão sobre os efeitos competitivos da alta carga regulatória do bloco, abordando a necessidade de algum espaço de experimentação para as empresas.
No caso brasileiro, a necessidade de atualização do parque industrial, tendo em vista a constante perda de participação da indústria no Produto Interno Bruto (PIB), também gerou movimentações no sentido elaboração de uma política industrial que possui o digital como foco. Uma das missões da Nova Indústria Brasil é a transformação digital de 50% das empresas industriais brasileiras até 20333. Dentro das ações nacionais para alavancar a pesquisa e o desenvolvimento de IA no país, em 2024 foi lançado o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA) 2024-2028, que congrega diversas ações visando aprimorar o papel do país em IA e outras tecnologias digitais, buscando apoiar desde a formação de mão de obra ao financiamento da infraestrutura.
Portanto, é importante avaliar como está o uso de IA entre as empresas brasileiras e europeias, no sentido de estabelecer o sentido de urgência diante os vultuosos recursos e investimentos dos países líderes na pesquisa e desenvolvimento da inteligência artificial.
De acordo com a última versão da pesquisa TIC Empresas, 13% das empresas brasileiras usaram algum tipo de aplicação de IA. Segundo a última versão da pesquisa europeia, 13,48% das empresas do bloco usavam algum tipo de IA, com Dinamarca, Suécia e Bélgica apresentando as maiores proporções, com 27,58%, 25,09% e 24,71%, respectivamente, de suas empresas utilizando IA. Portanto, na comparação com os países da União Europeia , observa-se que há um descolamento de alguns países mais digitalizados em direção a uma maior proporção de uso de IA, estando o Brasil em patamar semelhante à média da Europa.
Gráfico 1 – Uso de IA no Brasil e na União europeia
Total de empresas (%)

Ao analisar o uso de IA pelo porte das empresas no Brasil e na União Europeia, o padrão que se estabelece ao longo dos anos se mantém: as grandes empresas são aquelas com maior proporção de uso de IA .Uma vez que tais empresas possuem mais capacidade de investimento e de experimentação de tecnologias, bem como dado o caráter incipiente da IA, é de se esperar que elas possuam maior capacidade de adoção desse tipo de tecnologia. Na comparação entre Brasil e Europa, no entanto, os indicadores evidenciam uma aceleração no uso de IA entre as grandes empresas europeias, enquanto no caso brasileiro o quadro encontra-se estável. Em 2023, 30% das grandes empresas do bloco europeu usavam algum tipo de IA, resultado que foi de 41% em 2024, enquanto no Brasil essas proporções foram de 41% em 2023 e 38% em 2024.
Gráfico 2 – Empresas que utilizaram IA, Brasil e União Europeia, por porte (2023 – 2024)
Total de empresas (%)

Portanto, os dados da nova versão da pesquisa TIC Empresas indicam estabilidade no uso de IA no setor produtivo brasileiro, enquanto na União Europeia é possível perceber uma aceleração do uso, sobretudo entre as médias e grandes empresas, e nos países nórdicos. A análise dos dados evidencia que houve uma aceleração do uso de IA no bloco europeu, enquanto no Brasil observa-se certa dificuldade de generalizar o uso, sobretudo entre as grandes empresas, que são aquelas com recursos financeiros e humanos para explorar novidades tecnológicas.
Desta forma, é importante a elaboração de instrumentos de política pública que não sejam somente de financiamento, mas também de assessoramento, pois o cenário que se mostra para a implementação de tecnologias nas empresas se apresenta mais complexo do que em outros momentos de transformação produtiva, uma vez das aplicações amplas que tecnologias como IA ou IoT possibilitam para as mais diversas organizações. Sendo assim, buscar coordenar esforços entre diversos atores, visando a criação de ecossistemas de uso de tecnologias, pode ser uma estratégia que traz benefícios tanto para a implementação delas quanto para sua pesquisa e seu desenvolvimento. Vale destacar que tais práticas são recorrentes em países com tradição de inovação tecnológica, na medida em que há padrões consolidados de interação entre universidade e empresas, bem como ambientes criados exclusivamente para a exploração tecnológica (testbeds).

Leonardo Melo Lins é Pesquisador do Think Tank da Abes, participante do Programa de Pós-Doutorado do IEA/USP e Analista do Cetic.br | NIC.br. As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, os posicionamentos da Associação.
*Artigo originalmente publicado no ITForum em 27 de junho de 2025