Por Andriei Gutierrez
É preciso não deixar que a pauta da regulação de redes sociais ou das chamadas “big techs” desvie do necessário e estratégico debate sobre os desafios e oportunidades para o setor de TI no Brasil. A transformação digital há muito deixou de ser um “conceito de futuro” para se firmar como a realidade que molda o presente de economias globais. No Brasil, a evolução do setor de Tecnologia da Informação (TI) confirma um momento de expansão e maturidade, como mostram os dados mais recentes do Estudo de Mercado Brasileiro de Software — Panorama e Tendências 2025, conduzido pela ABES em parceria com a IDC. Em 2024, o país voltou ao grupo das dez maiores economias de TI do mundo e registrou um crescimento robusto de 13,9% nos investimentos, que totalizaram R$ 321,36 bilhões. Com isso, o Brasil manteve a 10ª posição no ranking global, respondendo por 1,58% do mercado mundial de TI e por 35% do mercado latino-americano — ainda que tenha havido uma leve redução nesta última participação.
Diante desse cenário, a ABES, entidade que representa mais de duas mil empresas, majoritariamente micro e pequenas empresas em todos os4Estados brasileiros, entende a importância de estabelecer uma Agenda Regulatória para impulsionar estrategicamente a competitividade digital do nosso país.
Construir um Brasil digital e competitivo não é tarefa das mais simples, mas também não é algo impossível. Tendo em mente que a economia digital é cada vez mais um dos motores do crescimento global, e que o Brasil precisa estar preparado para competir nesse ambiente, a Agenda Regulatória da ABES destaca justamente a necessidade de políticas públicas e regulatórias equilibradas e favoráveis à inovação. Defendemos que a tecnologia deve ser vista como uma prioridade de Estado, integrando-se a políticas públicas que garantam um ecossistema digital dinâmico e seguro.
Uma das principais propostas da agenda é a criação de uma governança centralizada para a transformação digital, vinculada diretamente à Presidência da República, de modo a coordenar a modernização do país com um olhar estratégico e de longo prazo. Essa iniciativa visa garantir que os avanços tecnológicos ocorram de maneira estruturada, independentemente de mudanças políticas. Nesse sentido, seguiremos trabalhando junto com outros setores econômicos no projeto Brasil Digital 2030 + com foco na governança centralizada.
Por outro lado, o setor público desempenha um papel central na inovação, seja por meio da regulação, seja pela aquisição de soluções tecnológicas inovadoras. Nesse sentido, propomos o fortalecimento do governo digital, com incentivo às infraestruturas públicas digitais, interoperabilidade de sistemas e abertura de dados públicos e acesso às infraestruturas para fomentar soluções inovadoras pelo setor privado.
Outro ponto crítico abordado é a urgência de uma política tributária mais racional para a tecnologia. Há tempos que a ABES alerta para o fato de que uma carga tributária elevada pode inibir o desenvolvimento do setor e afastar investidores, dificultando a consolidação de um mercado inovador e competitivo no Brasil. Defendemos que a tributação sobre empresas de tecnologia seja estruturada de forma a estimular o crescimento sustentável e a inovação, garantindo que as empresas possam reinvestir em qualificação, pesquisa e desenvolvimento.
A migração do crime organizado rumo ao cibercrime já e uma realidade. A segurança cibernética torna-se uma prioridade na medida em que esses criminosos miram cada vez mais infraestruturas digitais essenciais para setores econômicos e governamentais. Nesse contexto, a ABES defende a implementação de um Marco Legal da Cibersegurança e a criação de uma agência para centralização de políticas públicas, o fortalecimento da resiliência das organizações brasileiras e, assim, a prevenção ao cibercrime.
No que tange à IA, encorajamos o governo brasileiro a seguir avançando em iniciativas como o Plano Brasileiro para a IA (PBIA) para impulsionar o desenvolvimento e a adoção da IA no Brasil, independente da nacionalidade da empresa desenvolvedora da IA. No outro lado, sustentamos que a regulação não iniba o desenvolvimento da tecnologia ou crie restrições e obrigações excessivas para as organizações. Defendemos que direitos sejam preservados, mas que isso não ocorra em detrimento da segurança jurídica e da competitividade do nosso país.
Em outro extremo, a falta de profissionais qualificados é um dos maiores entraves para a expansão da TI no Brasil. Novamente, recorro ao Estudo de Mercado Brasileiro de Software – Panorama e Tendências 2025, que aponta um dado preocupante: a formação de profissionais de tecnologia não acompanha a demanda crescente das empresas! Para endereçar essa questão, a Agenda Regulatória sugere a ampliação de programas de capacitação, incentivo à retenção de talentos no país e estímulo a políticas de diversidade e inclusão digital. E, obviamente, defendemos a perenização da desoneração da folha de pagamento para as empresas de tecnologia, pois entendemos que este incentivo não só garante maior competitividade ao setor, como também permite ampliar a busca e contratar mais profissionais especializados.
A construção de um Brasil mais digital e menos desigual depende de ações concretas, que vão além da pauta da regulação de redes sociais e das chamadas “big techs”. A ABES trabalha para que o Brasil se posicione de maneira competitiva e estratégica no novo cenário global, cada vez mais impulsionado pela tecnologia. Assim, trazemos nossa Agenda Regulatória para 2025 para a construção de uma soberania digital competitiva com um olhar pragmático, de modo a garantir um ambiente regulatório equilibrado e alinhado a essa estratégia maior.

Por Andriei Gutierrez, Presidente da Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES)
*Artigo originalmente publicado no TI Expertise em 9 de dezembro de 2025



