Artigo por Rodolfo Fücher, Presidente do Conselho da Associação Brasileira das Empresas de Software – ABES
A industrialização no Brasil começou atrasada, cerca de 200 anos, mas conseguiu ocupar posições de destaque mundialmente. Porém, recentemente vem perdendo espaço como apontou o Vice-presidente e Ministro do Desenvolvimento Industria e Comércio, Dr. Geraldo Alckmin, ao dizer que “Durante boa parte do século XX e até a década de 1980, quando sua participação foi cerca de 20% do PIB.
O que se viu nos últimos anos foi o seu encolhimento, chegando a 11,3% do PIB em 2021”, e que “A reindustrialização é essencial para a retomada do desenvolvimento sustentável”, destacando a urgência de elaborar uma política moderna de desenvolvimento industrial alinhada com a economia verde.
O uso intensivo da tecnologia da informação, pilar central da transformação digital, tornou-se vital para a competitividade de qualquer nação, para a melhoria de qualidade de vida de sua população e, principalmente, para o crescimento sustentável de sua economia, atraindo investimentos e assegurando uma indústria competitiva e pujante.
Um bom exemplo do benefício do uso intenso da tecnologia da informação, é o resultado do estudo “The Impact Of AI On The World Economy” elaborado pela Mckinsey, que demonstra que as empresas líderes na utilização de IA (Inteligencia Artificial) deverão ter um ganho competitivo na ordem de 25% referente às oportunidades de mercado no mesmo período. Por outro lado, as empresas que ainda não estão investindo em IA poderão perder significativamente competitividade e, consequentemente, mercado. O estudo também aponta que o mesmo gap de competitividade deverá ocorrer entre países.
Um importante indicador referente à tendência do nível de competitividade de uma nação, de sua economia e de sua indústria é a sua capacidade de absorver tecnologia. Recentemente, a ABES – Associação Brasileira das Empresas de Software apresentou os resultados de seu Estudo Anual, no qual mapeia as tendências do nosso mercado de tecnologia da informação, compreendendo software, serviços e hardware (dispositivos).
Contrariando as nossas expectativas, o estudo apontou um crescimento de apenas 3%, bem abaixo das expectativas de crescimento de dois dígitos esperados, e abaixo da média mundial de 7.4% – eu, particularmente, não me recordo disto ter acontecido alguma vez. O estudo demonstra que ritmo de absorção de tecnologia do Brasil
, caiu em relação aos demais países.
O baixo consumo de tecnologia está diretamente relacionado à perda de competitividade de um país. Ao consumir menos tecnologia, perde a sociedade, perde o governo, perde a economia. E, se a economia perde, há um comprometimento real da pauta de reindustrialização. Um dos principais responsáveis é o indigesto arcabouço tributário, que, ao contrário da tecnologia, não evolui. Um regramento tributário complexo, cria interpretações equivocadas em relação à comercialização de bens e serviços, principalmente ligados ao mercado de tecnologia, impactando e até inviabilizando a disponibilidade de tecnologias de ponta, e onerando seu. E, paralelo a isto, o Brasil ainda engatinha quando o assunto é letramento digital. É muito difícil para qualquer país consumir tecnologia quando há barreiras para acessá-la, como também baixo conhecimento para absorvê-la e aproveitar todo o seu potencial, assegurando um alto nível de competitividade do país – e, aí sim, fomentar a reindustrialização.
Comparando a situação do Brasil com a dos demais países, o Brasil estava na 9º posição em 2020, caiu para a 12º em 2022. Na América Latina, fica claro como o país está perdendo forças, em 2020, nossa participação no mercado latino era de 44%; em 2021 caiu para 40%; e, em 2022, chegou a 36%. Caímos uma média de 4 pontos percentuais ao ano, enquanto o México, por exemplo, que detinha uma fatia 20% em 2020, viu a sua participação subir para 23% no ano passado. Até a Argentina conquistou mais espaço, consumindo mais tecnologia e com uma taxa de crescimento maior que a nossa.
A estratégia governamental, como mencionado, tem como objetivo a reindustrialização do Brasil. E, se constatamos uma queda de absorção de tecnologia no país, isso indica uma tendência de obsolescência. Por outro lado, o Brasil figura como o quinto maior mercado de usuários de internet, atrás da China, dos Estados Unidos, da Índia e da Indonésia, com cerca de 170 milhões de internautas conectados. Agora, se somos o quinto maior mercado de usuários, mas o 12º país em consumo de tecnologia, o que explica esse gap? Como entender essa conta? É simples, a tecnologia precisa estar disponível, acessível e ser conhecida. Ou seja, precisamos garantir que tecnologias de ponta estejam disponíveis no Brasil, sem barreiras e com arcabouço tributário de fácil compreensão, a preço acessíveis, e assegurar um alto nível de letramento digital da nossa sociedade.
A reforma tributária, em discussão no congresso, tem um objetivo nobre e esperado: simplificação, mas por outro lado, pode ser um verdadeiro tiro no pé na estratégia do governo de reindustrialização do Brasil, a proposta prevê elevar o imposto do setor da tecnologia da informação (TI) para 25%, certamente inviabilizará a absorção do principal insumo que poderia impulsionar a competitividade de nossa indústria: a tecnologia.
Rodolfo Fücher conta com mais de trinta e cinco anos de experiência no mercado de tecnologia, sendo 27 anos na Microsoft, ocupando diversas posições sêniores no Brasil e Estados Unidos. Foi responsável por elaborar políticas públicas por meio de coalizões entre associações da indústria, e liderar importantes parcerias com a Organização dos Estados Americanos e o Banco Interamericano de Desenvolvimento, as quais impactaram mais de 20 milhões de jovens em 21 países latino americanos. Formado em Tecnologia da Informação pelo Mackenzie, pós-graduado em Marketing pela ESPM, e com cursos de responsabilidade social pela FIA/USP, política pública pela Universidade George Washington, estratégia digital pela Columbia Business School, macroeconomia global pelo MIT, governança corporativa pelo IBGC, venture capital pela Berkeley, neurociência pela Wharton e convergência tecnológica pela Singularity University. Foi presidente da Associação Brasileira das Empresas de Software – ABES, com o propósito de colaborar na construção de um Brasil mais digital e menos desigual. Atualmente, preside o Conselho da ABES.
*Este artigo foi publicado originalmente no Portal IT Forum em 17 de abril de 2023.